Sob essa premissa saíram algumas daquelas que facilmente poderiam se enquadrar entre as melhores - ou mais divertidas - séries dos últimos anos, como é o caso do Cavaleiro da Lua, por exemplo, ou a nova Miss Marvel - a Kamala Khan - para citarmos um outro.
E, como nem tudo pode ser perfeito, eis que, nessa mesma leva, veio o novo ""Motoqueiro Fantasma"".
Com roteiros de Felipe Smith e "arte" de Trad Moore - e de Damion Scott na sexta edição - a série segue literalmente com a premissa do "tudo novo" com essa nova encarnação do personagem. Agora baseado em Los Angeles e dirigindo um carro - o que, por si só, levanta uma série de perguntas - o Motorista Fantasma agora é Roberto "Robbie" Reyes, um adolescente de um bairro latino ficcional de Los Angeles que, após ser morto num tiroteio, terminou sendo salvo da morte pelo espírito de Eli, o proprietário anterior do carro, e não um espírito da vingança. Como contrapartida, Robbie e Eli dividem agora o mesmo corpo, perseguindo toda sorte de malfeitores que assolam as ruas da cidade.
Para quem quiser uma opinião rápida e precisa sobre o encadernado, e não estão com disposição/paciência para ler todo o texto, vamos dizer que o parágrafo anterior conseguiu a incrível proeza de ser muito mais interessante do que todas as seis edições reunidas.
Para os outros que, tendo disposição/paciência para ler o texto todo, vamos por partes:
- A Arte:
Por um lado, é inegável que a arte de Moore trás à HQ um dinamismo e uma fluidez incríveis, algo que se verifica tanto nas sequências de ação, como também no ritmo frenético de leitura. Por outro, esse mesmo traço termina muitas vezes sendo caricatural demais - ora através das expressões faciais de seus personagens, ora na própria movimentação dos mesmos que, muitas vezes, mais parecem bonecos de pano dotados de pouca - ou nenhuma - estrutura óssea - algo que vai se reforçar ainda mais, se tornando ainda mais caricatural, na última edição do volume, assumida por Damion Scott.
Analisando friamente, porém, esses detalhes são mais uma questão de estilo do artista, não afetando diretamente o desenvolvimento da história - que, verdade seja dita, apresenta alguns pontos bem interessantes, como a decupagem de página, por exemplo, ou as sequências de ação, como é o caso dos rachas. Se existe algo que poderíamos apontar nesse sentido seria o fato de a arte não se "casar" bem com o texto. De fato, ocorre um tipo de choque entre a natureza estilizada do traço de Moore e o tom sério/sombrio ao qual a série se propõe, um lado sabotando o desenvolvimento do outro.
Mas talvez até isso pudesse ser burlado não fosse a qualidade tão fraca das histórias.
- O Roteiro:
Uma vez que se trata de uma história de origem, nada mais natural que a tendência de se manter preso ao básico do básico. E é preciso dizer que, nesse sentido, a história funciona bem. Longe de tentar ser revolucionário, Felipe Smith se concentra em basicamente contar quem é o personagem, em que mundo ele vive e quais seus inimigos, e só. Até aí, não haveria necessariamente um problema, não fosse pelo fato de não haver praticamente nada de realmente interessante na história - ou algo que a individualize como um todo. Existem, é verdade dois ótimos pontos que são a relação de Robbie com seu irmão mais novo, Gabe, e a ideia de transformar o personagem numa força de mudança para o bairro. Na primeira, a relação fraterna é genuinamente bem trabalhada, fazendo com que o leitor não só conheça, como também se importe com os dois, ao mesmo tempo em que isso o faz crer que essa relação também é forte o bastante para atuar como a bússola que guiará os passos do Motorista dali em diante. Na segunda, vemos Robbie e o Motorista se transformarem, aos poucos, numa presença capaz de alterar o bairro de uma maneira positiva - o primeiro de modo ativo, o segundo de modo colateral. Infelizmente, por ser apresentada já no fim do volume, essa ideia termina sendo mais sugerida do que realmente trabalhada - algo que possivelmente acontecerá nas próximas edições.
O restante da história, porém, mergulha nas já conhecidas - e extremamente cansativas - convenções de sempre. Como adolescente vemos Reyes envolvido com problemas com o bully da escola, ou tendo que lidar com um professor que, apesar de bem intencionado, está completamente fora de sintonia com o ambiente em que se encontra, sem jamais trazer nada de novo. Mesmo a sua morte/ressurreição passa completamente batida pelo personagem, sendo, uma breve discussão com Eli o mais próximo de um conflito que existirá nesse sentido.
Igualmente genéricos os antagonistas se resumem aos clichês de sempre de traficantes l de drogas,forças paramilitares. Há também a participação do Dr.Calvin Zabo/Mr.Hyde, um super vilão do terceiro escalão que, recém saído de Nova Iorque e buscando uma nova área para estabelecer o seu negócio, curiosamente, também de venda de drogas, mas tudo isso apenas para cair na velha história das gangues que disputam o mesmo ponto de venda. Ainda que seja uma estratégia coerente se usar um vilão menor - uma vez que sua fama não só não eclipse o protagonista estreante, como também permite ao mesmo um novo universo para ser desenvolvido - não existe nenhum trabalho em cima de Zabo/Hyde que os torne minimamente interessantes para a série, não só deixando os dois na mesmice de sempre - cientista louco/monstro gigante - como também os tornando mais esquecíveis do que de costume.
Em resumo, o grande problema aqui é que o Motorista Fantasma nada mais é do que mais do mesmo vendido numa roupagem "nova".
- Conclusão:
Na opinião deste humilde resenhista,porém, é mais do que certo que, ao preço de R$ 21,00, Motoqueiro Fantasma: Máquina da Vingança é uma ótima forma de gastar - e mal - dinheiro.