domingo, 10 de abril de 2016

Crítica: Demolidor - Segunda Temporada

O grande desafio em se tratando de continuações é que, ao mesmo tempo em que tem que se manter fiel à  obra antecessora, mas sempre acrescentando  algo de novo em sua narrativa,   a continuação precisa, inevitavelmente, lidar com todo o sucesso gerado anteriormente - e que se torna o parâmetro a partir do qual todo e qualqueires julgamento será feito.

Isso é especialmente verdadeiro no caso dos grandes sucessos e, assim sendo,  não é de surpreender que, desde o seu anúncio,  uma grande expectativa tenha se formado em torno da Segunda Temporada da série do Homem Sem Medo. O fato dela também se propor a trazer para as telas dois personagens icônicos da Casa das Idéias - o Justiceiro e Elektra - não ajudou em nada a conter a expectativa gerada, e é o resultado dessa empreitada que iremos discutir a seguir. 
O Justiceiro foi o grande destaque da segunda temporada. (Divulgação)
Dando prosseguimento aos eventos da Primeira Temporada, acompanhamos a vida dupla de Matt Murdock (Charlie Cox), advogado durante o dia, vigilante durante a noite, num momento de raro equilíbrio, que logo será completamente destruído pelo surgimento de um novo vigilante, o Justiceiro (Jon Bernthal), e o retorno de uma importante personagem de seu passado, Elektra (Élodie Yung) que trará sérias consequências para sua vida pessoal.

Já neste primeiro ponto está o grande divisor de águas entre as duas temporadas. Se na Temporada Um  tivemos um vilão central - o incrível Wilson Fisk de Vincent D´Onofrio -  para conduzir o embate da trama, na Tempora Dois essa figura é suprimida. Em seu lugar, entram em cena o Justiceiro e Elektra que atuam muito mais como fontes de um outro tipo de embate para o Demolidor. Ao passo que Fisk representa um mal propriamente dito, Frank Castle e Elektra trafegam pelas famigeradas zonas cinzas - como bem observado por Renato Félix em sua crítica sobre a série - da personalidade humana, não sendo nem puramente bons nem maus, o que transporta o confronto para um plano muito mais ético e moral do que físico.

Mas ainda que essa escolha marque a grande separação entre uma temporada e outra, é preciso ressaltar que ela vem como uma evolução lógica da mesma. Afinal, tendo a primeira temporada se focado na origem do herói, nada mais natural que sua sucessora se dedique a trabalhar seu desenvolvimento e amadurecimento moral.

Ainda falando sobre os recém-chegados, a atuação de Jon Bernthal é simplesmente sensacional, ombreando facilmente com a de D´Onofrio - sendo o encontro entre os dois um dos pontos altos da série. De fato, Bernthal rouba a cena em cada uma das aparições do Justiceiro, praticamente carregando a temporada nas costas. A Elektra de Élodie Young também é um dos pontos altos da série. Construindo uma personagem um pouco mais diferente da das HQs, a atriz francesa consegue dar uma nova dimensão a personagem, alternando de forma incrível entre momentos de comicidade e brutalidade. Infelizmente, sua personagem sofre muito com os caminhos escolhidos para o desenvolvimento da temporada.

Quanto ao elenco original, todos continuam com o trabalho de qualidade do ano anterior. Dentro desse meio, porém, é preciso ressaltar o desenvolvimento incrível da personagem de Karen Page (Deborah Ann Woll) que, entre uma temporada e outra, virou uma nova - e mais interessante - personagem, ganhando mais importância à medida em que a série avança.

Nos demais quesitos, seja no campo narrativo, seja no campo visual, a série se mantêm a mesma, trazendo de volta os cenários sujos e sórdidos - e as pessoas não menos sujas e sórdidas - que se tornaram tão marcantes.

Mas nem só de coisas boas se constituí essa Segunda Temporada. E, indiretamente, as próprias adições que a tornam tão interessantes são as responsáveis por seus maiores problemas.

Pois, ainda que a ideia de calcar o desenvolvimento da série em múltiplas linhas narrativas seja interessante,essa mesma ideia termina afetando o ritmo da série pelo modo como ela escolhe apresentar suas histórias. No caso as histórias do Justiceiro e de Elektra são quase antagônicas entre si. Explicando melhor, a história do primeiro é tão forte e interessante que cria todo um tom que não só permeia toda a série como também, em certo sentido, a conduz. Desse modo, o surgimento da ninja e sua história, que segue uma linha de tema e tom bem diferentes da do vigilante, acaba apequenado pelo primeiro, e o fato de vermos Castle em maior ou menor grau em toda a Segunda Temporada sufoca a história de tal modo que temos apenas um vislumbre da força que o arco de Elektra e o Tentáculo poderia ter. Talvez se fosse conduzida de outra forma, com Justiceiro sendo abandonado em determinado ponto para o desenvolvimento do que poderia ser uma série própria, a série pudesse ter conseguido conciliar bem essas duas linhas narrativas mas, do jeito que está apresentado, não deu muito certo.

Temporada foca no relacionamento do heroi com outros
personagens do universo Marvel. (Divulgação)
Outro problema da série é uma consequência natural de se trabalhar uma história com muitas linhas narrativas e pouco espaço para lidar com isso- os problemas de desenvolvimento e conclusão de cada uma delas. Ainda que os arcos do Justiceiro e Karen Page tenham um desenvolvimento e conclusão satisfatórios, os demais arcos - o de Elektra, os problemas da vida pessoal de Murdock, os problemas com a firma - terminam ficando muito corridos, e isso afeta muito a conclusão dos mesmos. No caso dos problemas com a firma de advocacia, por exemplo, todo o drama é tão apressado por causa das demais histórias que termina virando um ponto tão secundário que pode muito bem passar despercebido. O mesmo valendo para a premissa da vida pessoal de Murdock - e que, em certo sentido, é praticamente a premissa da série.

No caso de uma série maior, esses problemas poderiam facilmente passar despercebidos mas, numa série concisa - de apenas 13 episódios por temporada - como é Demolidor, são coisas que se tornam quase gritantes.

Mesmo assim, não é nada se comparado aos problemas de Batman Vs. Superman

Nota: 8,0

*Editado por Cisco Nobre às 12h22 de 12/04/2016